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IV. OS DIREITOS ECONÔMICOS, SOCIAIS E CULTURAIS 52. A Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem consagra não somente direitos civis e políticos, mas também direitos econômicos, sociais e culturais, dentre eles: o direito a proteção da família, a maternidade e a infância, a preservação da saúde e bem estar, a educação, os benefícios da cultura, o trabalho e uma justa remuneração, o descanso e o seu aproveitamento, a segurança social, e direito a associar-se para proteger os interesses econômicos, sociais, culturais e sindicais. 53. Durante o período coberto pelo presente relatório, a Comissão Interamericana foi informada sobre os avanços conquistados pelo Estado cubano na preservação da saúde. O direito a saúde está consagrado no artigo XI da Declaração Americana, o qual dispõe que “Toda pessoa tem direito a que sua saúde seja preservada por medidas sanitárias e sociais, relativas a alimentação, vestuário, a residência e assistência médica, correspondentes ao nível que permitam os recursos públicos e os da comunidade”. 54. Em Cuba, --segundo as informações proporcionadas-- o programa de saúde é parte essencial da política social e contribui para o desenvolvimento humano e a equidade. Este programa baseia-se nos seguintes princípios:
55. A aplicação destes princípios, sobretudo, o acesso gratuito do serviço, tornou possível a conquista da equidade na saúde, tanto no que se refere ao acesso geográfico como os distintos níveis de complexidade do Sistema Nacional de Saúde (SNS). Em Cuba, a saúde é um direito de todos os cidadãos, sem limitações quanto a raça, sexo, idade, e seu oferecimento é uma responsabilidade do Estado, que atua através de um organismo reitor: o Ministério de Saúde Pública (MINSAP). O marco jurídico que ampara este conceito são os artigos 47 a 50 da Constituição Política de Cuba.[35] 56. Segundo o estudo denominado “Investigação sobre Desenvolvimento Humano e Equidade em Cuba” dirigido pelo Centro de Investigações da Economia Mundial (CIEM) e publicado com o patrocínio do Programa das Nações para o Desenvolvimento (PNUD), Cuba conta atualmente com indicadores favoráveis de saúde e com um alto grau de homogeneidade nacional. O estudo assinala que
57. As principais reformas no setor da saúde a partir de 1960 foram as seguintes: a) Década de sessenta (Criação do Sistema Nacional de Saúde; Serviço Médico Rural; áreas de saúde e as policlínicas; introdução de procedimentos de luta contra doenças infecto-contagiosas; vacinação com ampla participação popular); b) Década de setenta (Desconcentração da docência médica; criação da policlínica comunitária e o modelo de atenção à comunidade; descentralização do setor da saúde aos governos provinciais; implantação do programa de atenção materno-infantil); c) Década de oitenta (Criação do Modelo de Medicina Familiar; desenvolvimento das especialidades médicas; introdução de tecnologia avançada; desenvolvimento acelerado da indústria médico-farmacêutica); d) Década de noventa (Introdução e generalização dos êxitos da ciência e da tecnologia; enfrentamento do embargo e a desintegração da União Soviética e o campo socialista; diagnóstico do setor; e elaboração das estratégias e programas prioritários).[37] 58. A saúde materno-infantil recebeu uma atenção prioritária. O indicador da taxa de mortalidade infantil resume as conquistas alcançadas de maneira sustentável pelo país em matéria de cuidados da saúde infantil. Segundo O Estado Mundial da Infância 1998, publicado pela UNICEF, Cuba ocupa a posição número 34 entre 193 países, relativa a taxa de mortalidade infantil em crianças de 5 anos. 59. Em 1993 foi registrada uma taxa de mortalidade infantil inferior a 9.4. Nos anos seguintes a taxa continuou diminuindo até chegar a 7.9 em 1997. Todas as mulheres grávidas recebem atenção pré-natal e praticamente o total dos partos ocorre em instituições hospitalares e com uma atenção adequada. Adicionalmente, Cuba está classificado como um país de baixo risco reprodutivo, de acordo com o Population Action International (PAI 1995).[38] 60. O Programa Nacional de Imunizações foi preservado e mantém erradicadas a poliomielite, a difteria e o tétano do recém-nascido. Em 1996, 98.5% das crianças cubanas menores de dois anos ficaram protegidas contra dez doenças transmissíveis: difteria, tétano, tosferina, sarampo, rubéola, parotidite, hepatite B, meningite meningocócica, tuberculose e poliomielite. 61. De fato, o perfil epidemiológico reflete as tendências originadas pela política social. Em Cuba foi erradicada a poliomielite (1962), a meningite tuberculosa (1971), o tétano neonatal (1972), a difteria (1979), a síndrome de rubéola congênita e a meningoencefalite por parotidite (ambas em 1989) e o sarampo (1993). A tosferina, a rubéola, o tétano e a parotidite não constituem problemas de saúde tendo em vista as taxas ínfimas de incidência (CIEM 1997). Exceto nos casos (influenza e pneumonia), as doenças infecto-contagiosas não aparecem entre as principais causas de morte. Estas são, na atualidade, as doenças de coração, os tumores malignos, as doenças cérebro-vasculares e os acidentes, padrão de mortalidade típico de países mais desenvolvidos (MINSAP 1998).[39] 62. Com respeito ao acesso a residência, também ocorreram avanços importantes em Cuba. Segundo as informações proporcionadas, em 1984, a Lei Geral da Habitação (revisada em 1988) transferiu a propriedade das residências estatais a seus usufrutuários e ocupantes legítimos. A cifra de proprietários de suas casas supera, atualmente, 85% de todas as famílias. Adicionalmente, a entrega da propriedade, a preços reduzidos e uma elevada subvenção estatal foi efetuada; das novas casas construídas pelo Estado, amortizáveis em prazos de 120 e 140 meses e com juros de 3% decrescente anual. A lei de 1984 facilitou o acesso dos cidadãos a terra para construir casas por esforço próprio, e abriu oportunidades para a obtenção de créditos bancários, aquisição de materiais de construção e prestação de serviços. Atualmente, 72.4% do fundo habitacional está localizado na zona urbana e 27.6% na zona rural (INVE 1999).[40] 63. A Comissão também foi informada que para o período 1996-2000 foi prevista a incorporação de 400 mil casas ao fundo habitacional, das quais 250 mil são nova construções e 150 mil se reincorporariam ao fundo estatal mediante ações de reabilitação por parte do Estado, as cooperativas e a população. O incremento neto do fundo de casas em 1998 (saldo existente entre o total de altas e o total de baixas) somou a 54,794 residências, o que representa um ritmo de crescimento anual de 1.8%, muito inferior ao planejado.[41] 64. Quanto ao direito a educação, o programa cubano teve avanços significativos que merecem ser destacados. Na atualidade, 97.4% das crianças de 6 a 14 anos estão escolarizadas e este indicador mostra um alto nível de homogeneidade territorial e por sexo; o nível médio de escolaridade da população é, em geral, de nove graus; a taxa de matrícula na educação superior é de 945 por cada 100 mil habitantes. O desenvolvimento educacional refletiu no avanço técnico-científico. Em 1997, o país tinha 220 centros de investigação científico e técnico, os quais empregam mais de 42 mil investigadores, professores universitários e outros técnicos. O país tem 1.8 científicos e engenheiros para cada mil habitantes, índice consideravelmente superior a média dos países em desenvolvimento. A educação superior dispõe de um corpo docente de 3 mil professores e uma matrícula de 155 mil estudantes. Desde 1959, graduaram-se mais de meio milhão de estudantes, o que representa, aproximadamente, 5% da população total do país.[42] 65. Um dos maiores destaques do êxito educacional em Cuba são as facilidades escolares e trabalhistas para o estudo dos trabalhadores ativos. Através de variados planos e programas de diversos tipos (elementar, básico e superior), os trabalhadores cubanos tiveram a opção de estudar sem necessidade de abandonar seus postos de trabalho e contam com o apoio das administrações trabalhistas. Hoje, de cada cem ocupados, sete possuem títulos universitários e 13 são técnicos médios. Outros esforços foram dirigidos a estender por todo o país uma rede de escolas de diferentes tipos e níveis de ensino, destinadas a cobrir o amplo espectro das necessidades educativas existentes nas províncias. Cabe assinalar que recentemente foi apresentado um estudo comparativo entre 13 países latino-americanos, que se distingue de outros anteriores em que --entre outros fatores—esteve orientado para a política educativa, foi realizado pelos sistemas educativos dos países participantes, e nele foram incluídos fatores associados ao rendimento acadêmico selecionando uma mostra duplamente estratificada e controlada. O relatório do estudo foi preparado pelo Laboratório Latino-americano de Avaliação da Qualidade da Educação. O primeiro capítulo entitulado, “Principais resultados do estudo”, afirma que: “Em seus resultados, Cuba destaca-se significativamente entre os países da região”. (UNESCO 1998). Segundo os resultados da aplicação do Índice da Educação Fundamental (IEF), elaborado pela UNESCO, Cuba ocupa o primeiro lugar entre as nações de Terceiro Mundo (CIEM 1977).[43] 66. O direito ao trabalho é outro dos direitos econômicos consagrados na Declaração Americana: Artigo XIV.- Toda pessoa tem direito ao trabalho em condições dignas e o de seguir livremente sua vocação, na medida em que for permitido pelas oportunidades de emprego existentes. Toda pessoa que trabalha tem o direito de receber uma remuneração que, em relação à sua capacidade de trabalho e habilidade, lhe garanta um nível de vida conveniente para si mesma e para sua família. 67. A Constituição Política de Cuba dispõe em seu artigo 45 que “O trabalho na sociedade socialista é um direito, um dever e um motivo para cada cidadão. O trabalho é remunerado conforme a sua qualidade e quantidade; sendo que ao proporcioná-lo são atendidas as exigências da economia e da sociedade, a eleição do trabalhador e sua aptidão e qualificação; o sistema econômico socialista o garante, e este propicia o desenvolvimento econômico e social sem crise, e que com ele se elimina o desemprego, apagado para sempre o chamado “tempo morto”. Reconhece-se o trabalho voluntário, não remunerado, realizado em benefício de toda a sociedade, nas atividades industriais, agrícolas, técnicas, artísticas e de serviço, como formador da consciência comunista de nosso povo. Cada trabalhador tem o dever de cumprir cabalmente as tarefas que lhe correspondem no seu emprego”. 68. O artigo 46 dessa Carta outorga ao trabalhador o “direito ao descanso, que é garantido pela jornada trabalhista de oito horas, o descanso semanal e as férias anuais pagas. O Estado fomenta o desenvolvimento de instalações e planos de férias”. Também está garantido um sistema de segurança social para “a proteção adequada a todo trabalhador incapacitado por saúde, invalidez ou doença. Em caso de morte do trabalhador [o Estado] garante similar proteção a sua família”.[44] O Estado cubano também “protege, mediante a assistência social, os idosos sem recursos nem amparo e a qualquer pessoa não apta para trabalhar que careça de familiares em condições de prestar-lhe ajuda”.[45] O artigo 49 da Constituição “garante o direito a proteção, segurança e higiene no trabalho, mediante a adoção de medidas adequadas para a prevenção de acidentes e doenças profissionais. Aquele que sofre um acidente no trabalho ou contrai uma doença profissional tem direito à atenção médica e a subsídio ou aposentadoria nos casos de incapacidade temporária ou permanente para o trabalho”. 69. Os artigos 42, 43 e 44 da Constituição Política de Cuba proíbem a discriminação no emprego por sexo ou raça, com o objetivo de garantir este princípio, promove a incorporação da mulher ao trabalho mediante uma série de facilidades como berçários, internatos escolares, licença maternidade --antes e depois do parto--, atenção a idosos, e opções trabalhistas temporárias compatíveis com sua função materna. 70. Não obstante, a Comissão deve manifestar que durante o período coberto pelo presente relatório recebeu numerosas denúncias de trabalhadores e sindicalistas independentes que foram objeto de ameaças, expulsões do trabalho por opiniões políticas, detenções temporais, intimidações, restrições do direito de movimento, prisões domiciliárias, violação de sua correspondência e interceptação das chamadas telefônicas, ademais de abusos físicos e verbais. 71. A Comissão foi informada também que as pessoas que demonstram discordância política com o regime são as que se encontram desempregadas em maior proporção, e que os familiares dos presos políticos sofrem discriminação no emprego, assim como os próprios presos políticos depois de liberados. A CIDH também recebeu informação de que esse tratamento é aplicado aos familiares de imigrantes quando estes assumem atitudes antagônicas no estrangeiro. A discriminação no emprego torna-se um mecanismo fácil de aplicar em uma economia na qual o Estado é o único empregador.[46] 72. A este respeito, a organização Human Rights Watch/Américas expõe sobre a situação trabalhista em Cuba da seguinte forma: Aproveitando sua condição de ser virtualmente a única fonte de empregos na economia controlada pelo Estado, o Governo cubano exerce um controle estrito dos direitos do trabalhador. Cuba não somente proíbe os sindicatos independentes e intimida as pessoas que tentam criá-los, como também não permite que se tomem em conta as opiniões políticas dos trabalhadores ao decidir sobre contratos e despedidas. A mão dura de Cuba sobre os direitos do trabalhador estende-se ao crescente setor de investimento estrangeiro, no qual as companhias estrangeiras somente podem contratar cubanos através de agências de emprego controladas pelo Governo. E o extensivo programa de trabalho nas prisões de Cuba descumpre os princípios básicos sobre o trato humano dos reclusos e viola a proibição internacional do trabalho forçado ao exigir aos presos políticos que trabalhem. Estas violações dos direitos do trabalhador estão em contradição com as afirmações do Governo cubano de que protege os direitos de associação, reunião e expressão, e do direito ao trabalho.[47] 73. Outra das imposições que o Estado cubano efetua sobre os trabalhadores é a obrigatoriedade de afiliação na Central de Trabalhadores de Cuba (CTC), única organização sindical permitida pelas autoridades. Conforme assinala a organização Pax Christi Netherlands: Como todos os cubanos, as pessoas empregadas nas firmas estrangeiras devem ser membros da organização de trabalhadores CTC (Central de Trabalhadores de Cuba) estritamente controlada pelo governo. Os cubanos selecionados para representar a seus companheiros de trabalho devem assistir primeiramente a cursos de doutrinamento. Segundo afirma um representante sindical: “Eu posso defender os trabalhadores em meu centro de trabalho somente até certo ponto. Se alguém viola os direitos do Estado eu não posso fazer nada por esta pessoa; se tentasse fazer algo, perderia meu posto”. Os trabalhadores cubanos que pertencem a sindicatos independentes, e são portanto ilegais, são expulsos de seu trabalho; inclusive os advogados que tentam defender a estas pessoas são intimidados e em muitos casos perdem o direito de exercer sua profissão. Estas pessoas são forçadas usualmente a ir ao exílio. Uma organização sindical independente como o Conselho Unitário de Trabalhadores de Cuba (CUTC) trata de prover ajuda legal a trabalhadores que foram despedidos por razões políticas. Segundo a afirmação de um representante da CUTC: “Nós redigimos alegações de defesa, orientamos as pessoas em seus direitos constitucionais, e na maioria dos casos os cubanos não tem idéia de quais são os seus direitos. O problema dos trabalhadores cubanos é que o Estado é legislador, empregador e árbitro de todos os assuntos trabalhistas”. Até onde sabem os investidores estrangeiros “os contratos entre as firmas e o Estado não são mostrados aos trabalhadores e estes não tem idéia de quanto a firma paga ao governo cubano por seus serviços”. O desconhecimento por parte dos trabalhadores de seus direitos e das leis que os protegem é um obstáculo para exigir melhores condições de trabalho.[48] 74. A exposição realizada no parágrafo acima citado sobre a situação dos sindicalistas independentes em Cuba é corroborada pelas numerosas denúncias recebidas pela Comissão durante o período coberto pelo presente relatório. Com efeito, a Comissão foi informada sobre as sovas, ameaças, detenções temporais, perseguição e negação de emprego a que são submetidos diariamente os sindicalistas independentes em Cuba. A seguir estão alguns dos casos mais relevantes: a. Pedro Pablo Álvarez Ramos, Secretário Geral do Conselho Unitário de Trabalhadores de Cuba (CUTC), foi detido em sua residência de Havana em 13 de outubro de 2001. A detenção de Álvarez esteve relacionada com a conferência de imprensa que o líder sindical e outros integrantes deste grupo convocaram nesse dia no domicílio da senhora Gladys Linares, membro da direção nacional do CUTC. A conferência tinha relação com a celebração do Congresso do CUTC, anunciado para os dias 20 e 21 desse mesmo mês. O CUTC, adstrito a Central Latino-americana de Trabalhadores, convocou o seu primeiro congresso, o que desatou uma onda repressiva que refletiu nas detenções durante várias horas de Carmelo Agustín Diaz Fernández, da direção do CUTC, Gladys Linares Blanco e Humberto Monés Lafita. Durante a batida policial, a polícia política lhes confiscou $5,040.00 dólares americanos doados por sindicatos holandeses para que a CUTC pagasse os gastos de sua reunião nacional. Até a data o dinheiro não foi devolvido. b. Sergio González Suárez Inclán, Secretário Geral da Confederação Obreira Nacional Independente de Cuba, na província de Matanzas, foi expulso de seu centro de trabalho na Empresa de Perfuração e Extração de Petróleo, ao ser declarado “não confiável politicamente”, onde trabalhava como eletricista. c. Manuel Lantigua Dominguez, de 41 anos e membro do Conselho Unitário de Trabalhadores Cubanos (CUTC) na província de Guantánamo, foi fichado e maltratado, somente pelo fato de pertencer a uma organização sindical independente. Em 8 de agosto de 2001, Lantigua foi citado pelo chefe da polícia do setor que reside, Tenente Iranelio Muñoz, para dirigir-se a estação da polícia de Guantánamo, onde tomaram suas as impressões digitais, lhe tiraram fotografias e iniciaram um expediente pelo suposto delito de “periculosidade social”. Em 9 de julho de 2001, este sindicalista já havia sido apedrejado na entrada de sua casa e golpeado por agentes das denominadas “Brigadas de Resposta Rápida”. d. Luis Sergio Uñes Rodríguez, delegado da Confederação Obreira Nacional Independente de Cuba (CONIC) em Bayamo, província de Granma, foi notificado em 30 de abril de 2001 sobre a proibição de abandonar sua residência durante a celebração de 1º de Maio sob a ameaça de ser conduzido a unidade policial localizada na avenida Francisco Vicente Aguilera, rua 4. A ordem de não sair de sua casa foi dada por um oficial da Segurança do Estado, que somente se identificou como sendo membro do grupo de atenção aos contra-revolucionários naquela região oriental. 75. Além de alguns dos exemplos acima relatados sobre o acosso sofrido pelos sindicalistas independentes em Cuba, a organização Human Rights Watch/Américas manifestou em seu Relatório Anual 2002 que:
76. O fato de que o Estado cubano proíba a criação de sindicatos independentes não somente viola suas obrigações internacionais[50] contraídas na matéria, mas também seus próprios princípios consagrados na Constituição Política, já que esta estabelece o direito de reunião e associação dos trabalhadores e declara que as organizações sociais “gozam da mais ampla liberdade de palavra e opinião, baseados no direito irrestrito a iniciativa e a crítica”.[51] Não obstante, a Comissão considera também que o Estado restringe as liberdades reconhecidas na Constituição através do artigo 62, o qual dispõe que não podem ser exercidos “contra a existência e fins do Estado socialista, nem contra a decisão do povo cubano de construir o socialismo e o comunismo”. Esta limitação é complementada pelo mandato da única confederação sindical autorizada e controlada pelo Estado, que estipula “o trabalho político-ideológico para aprofundar a luta pela defesa do socialismo e seus princípios”.[52] V. AS CONDIÇÕES PENITENCIÁRIAS 77. A Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem em seu artigo XXV estabelece inter alia que “Ninguém pode ser privado da sua liberdade, a não ser nos casos previstos pelas leis e segundo as praxes estabelecidas pelas leis já existentes. Ninguém pode ser preso por deixar de cumprir obrigações de natureza claramente civil. Todo indivíduo, que tenha sido privado da sua liberdade, tem o direito de que o juiz verifique sem demora a legalidade da medida, e de que o julgue sem protelação injustificada, ou, no caso contrário, de ser posto em liberdade. Tem também direito a um tratamento humano durante o tempo em que o privarem da sua liberdade”. 78. Os princípios acima citados significam que toda pessoa submetida a qualquer forma de detenção ou prisão deverá ser tratada humanamente e com respeito à dignidade inerente ao ser humano. A detenção ou prisão de uma pessoa somente será efetuada em estrito cumprimento da lei e por funcionários competentes e que não será restringido nenhum de seus direitos fundamentais com exceção, naturalmente, de aqueles que constituam precisamente o conteúdo da pena imposta. Neste sentido, é fundamental que a privação de liberdade tenha objetivos bem determinados, que não possam ser excedidos pela atividade das autoridades penitenciárias nem sob o manto do poder disciplinário que lhes compete e portanto, o recluso não deverá ser marginalizado mas reabilitado na sociedade. Isto é, a prática penitenciária deverá cumprir com um princípio básico: não se deve adicionar à privação de liberdade maior sofrimento do que esta já representa; o preso deverá ser tratado humanamente, com toda a magnitude da dignidade de sua pessoa, ao mesmo tempo que se busca sua reinserção social. A este respeito, a Comissão assinalou que:
79. O problema das detenções e encarceramentos arbitrários por motivos políticos e as duras condições penitenciárias que devem suportar os reclusos constituem uma das principais preocupações da Comissão com relação a Cuba. Isto explica porque uma parte importante de seus relatórios anteriores tenha sido destinada a analisar a situação dos presos políticos e que dois destes relatórios tenham versado exclusivamente sobre este assunto. 80. A Comissão Interamericana recebeu abundante informação sobre a situação carcerária em Cuba, no sentido de que subsiste o confinamento em condições precárias , escassez e baixa qualidade dos alimentos, deficiente atenção médica, sovas, internamento em celas de castigo --com portas fechadas e sem acesso a luz --, convivência de presos comuns com aqueles encarcerados por razões políticas e de condenados com detidos, visitas familiares limitadas, etc. A este respeito, o Relatório Anual 2002 da organização Human Rights Watch/Américas confirma a situação nas prisões cubanas:
81. Também o Relator Especial da Comissão de Direitos Humanos das Nações Unidas, Nigel Rodlei, em um relatório publicado em janeiro de 2001, manifestou inter alia que “notificou ao Governo [de Cuba] que havia recebido informação segundo a qual alguns centros penitenciários não cumpriam com as Regras Mínimas para o Tratamento dos Presos. (…) Os prisioneiros sofriam de má nutrição e permaneciam em celas fechadas e sem adequada atenção médica. Alguns deles sofriam abusos físicos e sexuais perpetrados por outros detidos que contavam com o consentimento dos guardas carcerários e passavam longos períodos de isolamento em suas celas. Em muitos casos não se separavam os presos comuns dos menores que esperam sentença”.[55] O Relator Especial informou a Comissão de Direitos Humanos das Nações Unidas sobre os seguintes casos:[56]
82. O Relator Especial das Nações Unidas, Nigel Rodlei, finalizou seu relatório fazendo as seguintes observações:
83. A Comissão também foi informada que os guardas das prisões e os presos comuns agrupados em Conselhos de reclusos, que atuam sob as ordens ou com a aquiescência das autoridades penitenciárias, castigam com golpes os presos políticos cubanos que expressam suas idéias ou críticas abertamente. Segundo as informações recebidas, Néstor Rodríguez Lobaina, Presidente do Movimento Cubano de Jovens pela Democracia (MCJD), condenado a seis anos de prisão no Combinado de Guantánamo, pelos supostos delitos de “Desacato” ao Comandante Fidel Castro, e “Violação da Ordem Pública” foi agredido fisicamente pelo preso comum Emeregildo Duvergel --condenado a 20 anos de prisão por assassinato – que lhe provocou uma fratura da mandíbula. Os presos políticos dessa prisão acusam o Tenente-Coronel Jorge Chediak, chefe da prisão; o Major Pablo Reyes Cobas, chefe do pavilhão A-500; o Capitão Silvestre Obet Herrera e o Capitão Víctor Reyes Cobas, chefe re-educador da companhia Nº 1 do A-500, como os responsáveis de ordenar os golpes. 84. A Comissão também foi informada que José Menéndez, preso político confinado na prisão Guamajal, em Santa Clara, sofre há seis anos o encarceramento numa cela que mede três metros de altura e meio metro de largura, para que suas convicções mudassem à força do isolamento. Lamberto Hernández Planas, preso político, foi agredido em 3 de agosto de 2001 por um dos oficiais da penitenciária “La Granjita” de Boniato, pertencente a província de Santiago de Cuba. Uma missiva escrita na prisão reporta que o chefe do estabelecimento, conhecido como Hechemendia, ordenou o oficial Yoel Gutiérrez López que perpetrara a agressão contra o preso político. Foi relatado também que os golpes sofridos por um preso na penitenciária de Combinado de Guantánamo ocasionou em 19 de agosto de 2001 um protesto massivo dos reclusos do andar 4B, e obrigou o alto comando da prisão a dirigir-se ao lugar para acalmar os ânimos. O protesto começou quando os funcionários da prisão realizaram uma revista no cubículo um do destacamento 43 e golpearam o presidiário Jesús Catalá, o que quase provocou um motim no estabelecimento penal. 85. A Comissão deve manifestar sua profunda preocupação pelas graves condições carcerárias em Cuba, as quais claramente violam os princípios e normas internacionais de direitos humanos na matéria, tais como a Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem e as Regras Mínimas Internacionais para o Tratamento dos Presos. [58] A Comissão observa que o tratamento é mais severo e degradante quando se trata de presos que estão cumprindo pena por delitos políticos. O Estado continua usando o sistema penal como base de sua defesa social, já que a função da sanção é proteger dos presos em geral aqueles “socialmente perigosos” e buscar a reeducação política do prisioneiro. VI. AS SANÇÕES ECONÔMICAS 86. A Comissão foi informada que no final do ano de 2001 haviam sido adotados alguns mecanismos tendentes a deixar sem efeito algumas das medidas unilaterais dos Estados Unidos dirigidas ao isolamento do regime cubano. Com efeito, segundo a Human Rights Watch/Américas, “[a] devastação provocada pelo furacão Michelle abriu uma brecha no embargo econômico norte-americano sobre Cuba, quando companhias daquele país venderam alimentos e medicamentos a Cuba em novembro de 2001 para compensar as perdas e repor aquelas existentes depois da pior tormenta na ilha em meia década. As vendas, valoradas pelos funcionários dos Estados Unidos em trinta milhões de dólares, representaram as primeiras transações comerciais entre os dois países desde a imposição do embargo. As autoridades de Washington haviam oferecido originalmente a Cuba ajuda para aliviar o desastre, mas os funcionários cubanos não aceitaram a oferta e expressaram seu interesse em comprar alimentos, medicinas e outras necessidades básicas”.[59] 87. A organização acima citada também recorda que “uma lei promulgada no [ ano] 2000 permitia a venda de alimentos a Cuba, e outra lei anterior autorizava a exportação de medicamentos. Entretanto, tendo em vista que a lei sobre vendas de alimentos proibia o financiamento oficial ou privado das vendas, os funcionários cubanos haviam dito previamente que iriam abster-se de comprar alimentos até que se levantara o embargo. A compra realizada este ano marcou a mudança desta posição, embora os funcionários cubanos insistissem que tratava-se de uma exceção. O Vice-presidente Carlos Lage explicou que não tinham razões para considerar as vendas como uma mudança de política, mas sim como algo que aconteceu devido ao furacão e que não passaria a ocorrer todos os meses em Cuba”.[60] 88. A Comissão também foi informada que no mês de maio de 2001, dois congressistas norte-americanos apresentaram um projeto de lei junto ao Congresso desse país para alocar até cem milhões de dólares durante quatro anos aos dissidentes, grupos de oposição, presos políticos ou qualquer outra organização independentes em Cuba. O projeto de lei denominado “Cuba Solidarity Act of 2001” foi rejeitado pelos dissidentes, quem consideraram que mais que um benefício tratava-se de um pré-julgamento porque temiam que essa ajuda financeira pudesse danificar sua credibilidade e contribuiria para desacreditar suas opiniões. Em março de 2001 foi introduzida uma proposta paralela na Câmara de Representantes. Em novembro de 2001, ambas versões do projeto de lei estavam sendo revisadas pelos comitês do Congresso. A este respeito, Héctor Palacio Ruíz, Diretor do Centro de Estudos Sociais Independente, manifestou desde Havana, Cuba, que
89. A Comissão espera que continuem adotando-se as medidas que sejam necessárias a fim de por fim ao embargo comercial contra Cuba, tendo em vista que as sanções econômicas e as medidas unilaterais tendentes a isolar o regime cubano geram um grave impacto sobre os direitos econômicos e sociais da população, que vem a ser o sector mais vulnerável em todo este problema. A Comissão estima que as reformas internas tanto políticas como econômicas seriam facilitadas com o fim do isolamento atual de Cuba, e considera que as prolongadas políticas de sanções econômicas converteram-se em uma forma de justificar as limitações e a falta de abertura do sistema. 90. Cabe ressaltar que a comunidade internacional expressou em numerosas oportunidades através de resoluções da Assembléia Geral das Nações Unidas e também no âmbito interamericano seu desacordo com as medidas unilaterais que não ajudam a instauração de um processo de transição política pacífica em Cuba. A comunidade interamericana tem o dever de velar para que se preste uma adequada assistência humanitária à população cubana, e necessita potencializar a cooperação técnica e financeira multilateral e bilateral com Cuba a fim de permitir que tanto o Governo como o povo desse país possa empreender de forma coletiva as reformas políticas e econômicas que a situação atual reclama com urgência. A comunidade interamericana deverá observar atentamente a evolução da situação dos direitos humanos em Cuba, pois na medida em que aquela melhore se estará pondo à prova a vontade política do Governo para realizar reformas que permitam uma irrestrita vigência dos direitos civis, políticos, econômicos, sociais e culturais. 91. Nesse sentido, a Comissão Interamericana estima que corresponde ao Estado cubano o principal esforço de incorporar a seu ordenamento legal e constitucional e a sua prática elementos que sejam compatíveis com o ordenamento internacional de direitos humanos. A CIDH estima que são os cidadãos cubanos, sem exceções, os que devem ter a oportunidade de pronunciar-se de maneira livre sobre assuntos que afetam profundamente o exercício de seus direitos. A Comissão considera que é através de procedimentos democráticos e com pleno exercício dos direitos inerentes a pessoa humana que poderão ser superadas as atuais dificuldades de maneira pacífica e com o menor custo social para a população. 92. No marco de suas funções e atribuições, a Comissão continuará observando a situação dos direitos humanos em Cuba e espera que a vigência efetiva destes direitos pelas autoridades e o povo cubano, com o apoio da comunidade interamericana da qual Cuba forma parte. VII. CONCLUSÕES Tendo em vista o exposto neste relatório, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos deseja expor as seguintes conclusões: 1. O Estado cubano adotou algumas medidas em matéria de direitos humanos que a Comissão valoriza como positivas. Na opinião da Comissão, as medidas mais importantes estão relacionadas com a liberação de alguns presos políticos durante o período coberto pelo presente relatório. A Comissão espera que o Estado continue com este processo a fim de por fim de uma vez por todas à prisão política de centenas de pessoas que se encontram cumprindo pena em penitenciárias cubanas. 2. É motivo de preocupação para a Comissão a continuidade –em comparação a anos anteriores—do padrão repressivo do Estado contra toda pessoa que intenta exercer seus direitos a liberdade de expressão, reunião e associação, de uma maneira que o Governo desaprova. Neste sentido, os opositores pacíficos, jornalistas e sindicalistas independentes, e ativistas de direitos humanos que tentaram por diversos meios --todos eles pacíficos-- exercer seus direitos a liberdade de expressão, reunião, associação, informação, movimento, e manifestação pacífica, viram muitas vezes seus propósitos frustrados em virtude das severas e variadas sanções impostas pelo Estado cubano. Esta legislação, caracterizada por disposições tais como o estado perigoso, as medidas de segurança pré-delitivas e os termos legalidade socialista, socialmente perigosa, normas de convivência socialista, propaganda inimiga, rebelião, advertência oficial, pirataria, vínculos ou relações com pessoas potencialmente perigosas para a sociedade, constituem o marco jurídico para que as autoridades cubanas cometam violações dos direitos humanos. Na opinião da Comissão, a aplicação destas normas contra pessoas que desejam exercer seus direitos fundamentais constitui violações do ordenamento internacional dos direitos humanos. 3. A administração da justiça continua subordinada de fato e de direito ao poder político, o que afeta a vigência prática do direito à justiça e ao devido processo. Isto cria um clima negativo de insegurança e temor entre a sociedade, que é reforçado pela debilidade das garantias processuais, especialmente naqueles julgamentos de opositores pacíficos ao regime ou ativistas de direitos humanos. A CIDH estima que, porque não existe em Cuba uma divisão de poderes que garanta a independência da administração da justiça, se vulnera gravemente o direito dos acusados a um julgamento justo, e com isto se podem transgredir outros direitos fundamentais da pessoa humana, tais como a vida, a liberdade individual, a liberdade de expressão, reunião e associação, etc. 4. No âmbito dos direitos econômicos, sociais e culturais, merecem destaque diversos avanços positivos logrados pelo Estado cubano. O direito a saúde, a atenção médica e dentária constituem um direito universal em Cuba, e estão disponibilizados pelo Estado gratuitamente. Numerosas e positivas medidas foram tomadas para estender este direito a todos os setores da sociedade, sem importar o sexo, idade, cor, crença, ingresso ou lugar de residência. Também foi realizado um considerável progresso na redução da taxa de mortalidade infantil, e no desenvolvimento da saúde de crianças. A prevenção, tratamento, e controle das doenças epidêmicas melhoraram muito através dos anos. 5. Com relação ao direito a educação, a Comissão estima que também houve avanços importantes. A educação primária e secundária é acessível e gratuita em todos os níveis e obrigatória até o 9º curso. A educação técnica, vocacional e universitária alcança a maior parte da população, e a educação para adultos foi incentivada e intensificada com numerosos resultados positivos. Não obstante, a discriminação educativa por razões políticas é um fato que ainda se mantém e deve ser condenado. O acesso à propriedade também teve progresso. A legislação sobre habitação em Cuba transferiu a propriedade das residências estatais a seus usufrutuários e ocupantes legítimos. Adicionalmente, foi facilitado o acesso à terra para construir residências por esforço próprio, e foram abertas oportunidades para a obtenção de créditos bancários, aquisição de materiais de construção e prestação de serviços. 6. No que se refere ao direito trabalhista e sindical, a Constituição Política contem uma série de mecanismos legais, econômicos e sociais que, se colocados em prática poderiam levar a uma irrestrita vigência destes direitos em Cuba. Todavia, na realidade o Estado cubano viola sistematicamente os direitos trabalhistas e sindicais dos cubanos. Trabalhadores e sindicalistas independentes sofrem ameaças e expulsões do centro de trabalho, detenções transitórias, intimidações, restrições do direito de movimento, prisões domiciliárias, violação de sua correspondência e interceptação das chamadas telefônicas, além de abusos físicos e verbais por verter opiniões políticas. A Comissão também teve conhecimento que as pessoas que demonstram divergências políticas com o regime são as que se encontram desempregadas em maior proporção e que os familiares dos presos políticos também sofrem discriminação no emprego, assim como os presos políticos depois de liberados. Este tratamento discriminatório também é aplicado aos familiares de emigrantes quando estes assumiram posições antagônicas no estrangeiro. 7. Quanto às condições penitenciárias, a Comissão deve manifestar sua profunda preocupação porque o Estado cubano continua violando as normas internacionais para o tratamento dos reclusos. Com efeito, o confinamento em condições precárias, as péssimas condições higiênicas, escassez e baixa qualidade de alimentos, deficiente atenção médica, surras e internamento em celas de castigo –com portas fechadas e sem acesso a luz-- convivência de presos comuns com prisioneiros políticos e de condenados com detidos, visitas familiares limitadas ou restringidas, são algumas das condições atuais nas prisões cubanas. Estas condições violam princípios e normas internacionais de direitos humanos na matéria tais como a Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem e as Regras Mínimas Internacionais para o Tratamento dos Presos. A Comissão conclui, outrossim, que o tratamento é mais severo e degradante quando se trata de presos que estão cumprindo pena por delitos políticos. 8. Com respeito às sanções econômicas, a Comissão observa que os avanços conquistados no processo deveriam implicar no levantamento definitivo do embargo comercial a Cuba. A Comissão considera que a comunidade interamericana tem a responsabilidade de criar condições externas que permitam que a sociedade cubana supere a situação que atualmente a afeta a fim de alcançar uma irrestrita vigência dos direitos humanos. Neste sentido, a Comissão considera que os efeitos adversos derivados das sanções econômicas e outras medidas unilaterais dirigidas ao isolamento do governo cubano constituem um obstáculo para criar essas condições tão necessárias para alcançar a pacífica e gradual transição em direção a um sistema democrático de governo. Estas medidas restritivas não fazem mais que reafirmar os fins políticos dos setores oficiais do Estado cubano que temem qualquer flexibilização no atual controle da sociedade. VIII. RECOMENDAÇÕES A continuidade das violações dos direitos humanos durante 1999 obriga a Comissão Interamericana de Direitos Humanos a reiterar, basicamente, as mesmas recomendações feitas no ano anterior ao Estado cubano. Trata-se de medidas que melhorariam substancialmente a situação dos direitos humanos e que, em muitos casos, requerem decisões puramente administrativas. De conformidade com o artigo 57(1)(h) de seu Regulamento, a Comissão formula as seguintes recomendações ao Estado cubano: 1. Cessar a perseguição e punição dos cidadãos cubanos por motivos vinculados ao exercício da liberdade de expressão, reunião e associação. 2. Adotar medidas urgentes destinadas a continuar pondo em liberdade –sem condições-- os presos de consciência. 3. Eliminar da legislação penal toda figura delitiva que sancione a liberdade de expressão, associação e reunião de forma contrária aos padrões democráticos internacionalmente aceitos. Em matéria de liberdade de imprensa, deixar sem efeito toda norma e ato que tenda a criar mecanismos para a auto-censura ou censura prévia. 4. Eliminar do Código Penal as disposições sobre o estado perigoso, as medidas de segurança pré-delitivas e os termos “legalidade socialista”, “socialmente perigosa”, “normas de convivência socialista”, e “moral socialista”, já que sua imprecisão e subjetividade constituem um fator de insegurança jurídica que cria as condições para que as autoridades cubanas cometam arbitrariedades. Eliminar a norma penal referente a “advertência oficial” mediante a qual ameaça punir os indivíduos que tenham "vínculos ou relações com pessoas potencialmente perigosas para a sociedade”. 5. Adotar medidas urgentes a fim de realizar uma reforma do sistema penitenciário do país, com a finalidade de melhorar as condições de vida dos presidiários. O Estado cubano deve realizar um exaustivo exame dos antecedentes das autoridades penitenciárias antes de designá-las aos distintos estabelecimentos penais do país, a fim de evitar o maltrato e os abusos contra os reclusos. Neste sentido, seria importante que o Estado cubano criasse um regulamento com lineamentos a serem aplicados às autoridades para que houvesse limites no cumprimento de suas funções. 6. Adotar as medidas necessárias, a fim de que se permita o pluralismo ideológico e partidário para o pleno exercício do direito a participação política, de conformidade com o artigo XX da Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem. IX TRÂMITE DO RELATÓRIO1. O projeto de relatório sobre a situação dos direitos humanos em Cuba foi aprovado pela Comissão no curso de seu 114º período ordinário de sessões. Em 12 de março de 2002 foi transmitido ao Estado conforme o estabelecido no artigo 57(2) do Regulamento da Comissão, a fim de que este apresente suas observações no prazo de um mês. 2. Expirado o prazo, o Estado cubano se absteve de apresentar observações sobre o conteúdo do relatório. 3. Em 16 de abril de 2002, a Comissão aprovou o relatório de forma definitiva, bem como sua publicação no Capítulo IV do presente Relatório Anual. [ Indice | Anterior | Próxima ] [35] Investigação sobre Desenvolvimento e Equidade em Cuba, 1999, Centro de Investigações da Economia Mundial (CIEM), Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), Editorial Caguayo S.A., 2000, página 97. [36] Investigação sobre Desenvolvimento Humano e Equidade em Cuba, 1999, Centro de Investigações da Economia Mundial (CIEM), Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), editorial Caguayo S.A., 2000, página 98. [37] Idem. [38] Population Action International (1995) estabeleceu um Índice de Risco Reprodutivo, o qual foi elaborado sobre base de um conjunto de indicadores selecionados e adquire valores entre 0 e 100; quanto mais alto o número, mais alto o risco reprodutivo. Cuba apresenta um resultado de 18.5 pontos (PAI 1995). [39] Idem, páginas 103 e 104. [40] Investigação sobre Desenvolvimento Humano e Eqüidade em Cuba, op.cit., páginas 106 e 107. [41] Idem., páginas 107 e 108. [42] Idem., páginas 80 e 81. [43] Centro de Investigações da Economia Mundial (CIEM), Investigação sobre Desenvolvimento Humano e Eqüidade em Cuba, op.cit., páginas 83 e 84. [44] Artigo 47 da Constituição Política de Cuba. [45] Artigo 48 da Constituição Política de Cuba. [46] A Confederação Obreira Nacional Independente de Cuba (CONIC) e a Federação Sindical de Plantas Elétricas, Gás e Água de Cuba, informaram a CIDH, em julho de 2001, os seguintes casos:
[47] Human Rights Watch/Américas, A Máquina Repressiva de Cuba, op.cit., página 182. [48] Idem., página 13. [49] Human Rights Watch/Américas, Relatório Anual 2002, op.cit., página 6. [50] Cuba ratificou em 25 de junho de 1952 o Convênio Nº 87 sobre a liberdade sindical e a proteção do direito de sindicalização de 1948. [51] Artigo 54 da Constituição Política de Cuba. [52] Silvia Martínez e Emilio del Barrio, “VIII Pleno do Comitê Nacional de CTC: Encara o Movimento Obreiro a luta contra o Delito e Outras Deformações”, Granma Diario, Havana, Cuba, 27 de maio de 1998. [53] CIDH, Relatório sobre a Situação dos Direitos Humanos no Brasil, página 66, parágrafo 37, OEA/Ser.L/V/II.97, Doc. 29 rev. 1, 29 de setembro de 1997, Secretaria Geral da Organização dos Estados Americanos, Washington D.C., 1997. [54] Human Rights Watch/Américas, Relatório Anual 2002, Cuba, op.cit., páginas 2 e 4. [55] Nações Unidas, Conselho Econômico e Social, Comissão de Direitos Humanos, Qüinquagésimo sétimo período de sessões, ponto 11(a) do projeto de tema Direitos Civis e Políticos Incluídos os Temas da Tortura e a Detenção, Relatório do Relator Especial, Sir Nigel Rodlei, apresentado de conformidade com a resolução da Comissão de Direitos Humanos 2000/43, E/CN.4/2001/66, 25 de janeiro de 2001, página 78, parágrafos 356 e 357. [56] Idem., págs.78- 82. [57] Idem., pág. 82. [58] O Estado cubano afirmou que cumpre com as Regras Mínimas num Relatório da Promotoria Geral da República de Cuba, apresentado por Blanca Gutiérrez, Promotora da Direção de Controle da Legalidade dos Estabelecimentos Penitenciários de Cuba, na conferência do Instituto Latino-americano das Nações Unidas para a Prevenção do Delito e o Tratamento do Delinquente, San José, Costa Rica, fevereiro de 1997, p. 5, em Human Rights Watch/Américas: A Máquina Repressiva de Cuba, op.cit., página 98. [59] Human Rights Watch/Américas, Relatório Anual 2002, op.cit., páginas 9 e 10. [60] Idem., página 10. |