60. Um dos temas aos quais a Comissão Interamericana de Direitos Humanos tem dedicado uma atenção especial em relatórios anteriores é o direito que os cidadãos cubanos têm de residir em sua própria pátria, de sair dela, e de regressar quando julguem conveniente. Neste sentido, a Comissão observa com preocupação que a legislação cubana continua sem reconhecer o direito de uma pessoa sair de seu próprio país e regressar ao mesmo, já que os cidadãos necessitam de contar com uma permissão do Ministério do Interior para sair ao estrangeiro. Cabe destacar que as autoridades cubanas de imigração continuam negando vistos por motivos políticos, afetando desta forma um direito fundamental da pessoa humana. A seguir, alguns dos casos ocorridos durante o período coberto pelo presente relatório que demonstram a situação imperante:
61. A Comissão Interamericana de Direitos Humanos foi informada, da mesma forma, que tampouco foi reformado o artigo 216 do Código Penal que pune as pessoas que tentam sair do país de maneira informal. O aspecto grave desta norma baseia-se no fato de que ela não apenas determina o processo contra pessoas que são capturadas depois de haver iniciado a viagem, mas também daqueles que possam tentar fazer isso. Com efeito, o artigo 216 do Código Penal assinala textualmente o seguinte:
62. A Comissão Interamericana também recebeu informações de que as autoridades cubanas estão aplicando, por motivos políticos, a pena de desterro e de limitação da liberdade. O artigo 42 do Código Penal estabelece que:
63. De sua parte, a punição de limitação de liberdade, estabelecida no artigo 34 do Código Penal cubano assinala, inter alia, que ela "é subsidiária da privação de liberdade que não exceda três anos, e é aplicável quando, pela índole do delito e suas circunstâncias, e pelas características individuais do punido, existam razões fundamentadas para calcular-se que a finalidade da punição possa ser alcançada sem encarceramento." Durante sua execução, o punido "a) não pode mudar de residência sem autorização do tribunal; b) não tem direito a promoções nem a aumentos de salário; c) está obrigado a comparecer perante o tribunal quantas vezes seja chamado para oferecer explicações sobre sua conduta, durante a execução da punição; d) deve observar uma atitude honesta em relação ao trabalho, de estrito cumprimento das leis e de respeito às normas de convivência socialista...A punição de limitação de liberdade é cumprida sob a supervisão e vigilância das organizações de massa e sociais do lugar de residência do punido" (ênfase acrescentada).
64. A Comissão Interamericana de Direitos Humanos deve manifestar sua profunda preocupação pela vigência destas normas do Código Penal cubano, que não fazem mais do que violar os princípios consagrados na Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem. Com efeito, o artigo VIII do mencionado instrumento internacional assinala que:
65. A Comissão calcula, da mesma forma, que a imprecisão e subjetividade de termos como "socialmente perigosa" e "normas de convivência socialista", utilizados pelo Código Penal cubano, constituem um fator de insegurança jurídica, e presta-se para que as autoridades cubanas cometam todo tipo de arbitrariedades. A imprecisão e a amplitude do conceito de periculosidade permite ao Estado cubano impor à força a ideologia oficial, dando lugar a injustiças e violando, desta forma, os direitos à liberdade individual, ao processo devido, à residência e ao trânsito. 21/ A Comissão Interamericana considera pertinente citar alguns casos que ilustram a situação descrita nos parágrafos anteriores:
66. Também durante o curso do período coberto pelo presente relatório, a Comissão Interamericana recebeu informações de que o tempo máximo de estadia no exterior, de maneira temporária, é de 11 meses, e a saída definitiva vai acompanhada de medidas confiscatórias. Da mesma forma, os cidadãos cubanos que residem no estrangeiro necessitam de uma permissão especial para cada entrada, cuja tramitação sujeita-se ao pagamento de altas tarifas, para os padrões cubanos. Tais permissões de estadia também podem ser de curta duração (15 dias, 1 mês) e são exigidos independentemente de qual seja o país de residência.22/
67. A Comissão Interamericana foi informada, da mesma forma, que continua sendo extremamente difícil emigrar mesmo que não seja formalmente proibido para os médicos e certas outras categorias de técnicos, a menos que sejam de idade avançada, e lhes restando poucos anos de atividade produtiva. Restringe ainda mais a possibilidade de emigrar o fato de que quem desejar fazê-lo deve abandonar seus bens e renunciar a seu emprego.
68. Outro dos assuntos que sempre foram objeto de preocupação para a Comissão Interamericana de Direitos Humanos é a situação dos navegantes cubanos que, ano após ano, lançam-se ao mar em busca de melhores perspectivas de vida. Assim, a Comissão manifestou que em 1993 chegaram às costas dos Estados Unidos da América 3.656 navegantes, calculando-se por alto que apenas um em cada três foi bem sucedido em seu intento. Tal cifra aumentou consideravelmente no curso de 1994, especialmente depois de que, em princípios do mês de agosto desse ano, os guarda-costas e policiais cubanos permitiram a saída em massa da ilha de toda pessoa que lançou-se ao mar em precárias embarcações. Com efeito, a cifra correspondente a 1994 é de 30.000 pessoas.23/
69. As fontes de informação com as quais conta a Comissão Interamericana indicam que os acordos migratórios assinados no curso de 1995 entre Cuba e os Estados Unidos têm como principal objetivo impedir que esse fenômeno siga ocorrendo. O compromisso do Governo dos Estados Unidos consiste em devolver à ilha todos aqueles cubanos que sejam interceptados no mar, em vez de lhes facilitar a entrada, como era a prática até o ano de 1994. De sua parte, o Governo cubano compromete-se a não praticar represálias contra essas pessoas ou contra aquelas que solicitem vistos para deixar o país.24/ Não obstante, a Comissão tem sido informada que na prática, as pessoas repatriadas ainda que não sejam processadas continuam sendo objetivo de todo tipo de discriminação por motivos políticos, especialmente quando se trata de conseguir emprego.
70. De acordo com o assinalado, a Comissão Interamericana considera que o Estado cubano continua restringindo o direito de residência e trânsito, consagrado na Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem. O controle exercido pelo estado cubano tem, evidentemente, conotações políticas, já que os mais afetados são os que manifestam posições críticas em relação ao grupo que está no poder. Cabe assinalar, da mesma forma, que o direito de residência e trânsito não está reconhecido na Constituição, o qual constitui uma anomalia que deveria ser corrigida.
V. AS CONDIÇÕES PENITENCIÁRIAS
71. Em seu Relatório de 1994, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos manifestou sua preocupação com "as graves condições carcerárias e o tratamento deliberadamente severo e degradante que o Governo cubano concede aos presos, fatos que configuram sérias violações aos direitos humanos".25/ A esse respeito, a Comissão lamenta ter que manifestar que tal situação não mudou. Muito pelo contrário, a Comissão deve manifestar que durante o período coberto pelo presidente relatório, as denúncias recebidas em relação às graves condições às quais, diariamente, é submetida a população carcerária em Cuba, sobrepassam amplamente às que se dão conta das violações de outros direitos consagrados na Declaração Americana.
72. Com efeito, a superlotação, as péssimas condições higiênicas, a escassez e a baixa qualidade dos alimentos, a deficiente atenção médica, os espancamentos, a internação em células solitárias com portas vedadas e sem acesso à luz , a convivência dos presos comuns com aqueles encarcerados por motivos políticos e dos condenados com os detidos, as visitas familiares limitadas, etc, são algumas das condições imperantes nos cárceres cubanos. As fontes de informação dão conta, da mesma forma, da existência de 294 prisões e campos de trabalho correcional em todo o país, com cerca de 100.000 a 200.000 presos de todas as categorias.26/ Por outro lado, a Comissão Interamericana também foi informada de que, no mês de julho de 1996, existiriam aproximadamente 1.173 pessoas processadas por delitos com conotações políticas.27/
73. Existem, de sua parte, seis prisões de segurança máxima em Cuba. A. Combinado del Este (Havana); B. Cinco y Medio (Pinar del Río); C. San Severino (Matanzas); D. Santa Clara (Las Villas); E. Kilo Siete (Camaguey); e F. Boniato (Oriente). As granjas são centros de detenção cercados por arames farpados e guardas armados e as frentes abertas são lugares de trabalho no campo ou na cidade, onde a segurança é mínima. Assinalou-se que os presos das "granjas" produzem os elementos pré-fabricados para a construção, e os presos das "frentes abertas" os montam. As três etapas de reclusão são de máxima, menor e mínima segurança, correspondendo ao cárcere, à granja, e à frente aberta.
74. A base do sistema penal cubano é a defesa social. A função das punições é proteger o grupo das pessoas consideradas "socialmente perigosas" e buscar a reeducação do punido. Por outro lado, o tratamento penitenciário durante a privação de liberdade estabelece, teoricamente, que deve-se remunerar os punidos pelo trabalho socialmente útil que eles realizem; que eles sejam providos de roupas e calçados apropriados; que lhes seja facilitado o repouso diário normal e um dia de descanso semanal; que lhes seja proporcionada assistência médica e hospitalar, em caso de doença; que lhes seja concedido o direito de obter as mensalidades a longo prazo da seguridade social, nos casos de invalidez total oriunda de acidentes de trabalho. Se o detento falecer por acidentes de trabalho, sua família receberá a pensão correspondente. Que lhes seja dada a oportunidade de receber e ampliar sua preparação cultural e técnica; que lhes seja proporcionada, na medida e forma estabelecidas nos regulamentos, a possibilidade de trocar correspondência com pessoas que não estejam detidas em centros penitenciários, e de receber visitas e artigos de consumo; que, segundo seu comportamento, e na medida e forma estabelecidas pelos regulamentos, lhes seja autorizado fazer uso do pavilhão conjugal; que lhes sejam concedidas licenças extra-penais por tempo limitado; que lhes seja dada a oportunidade e meios de desfrutar de recreação e praticar esportes, de acordo com as atividades programadas pelo estabelecimento penitenciário, e que eles sejam promovidos de um regime penitenciário a outro de menor severidade.28/
75. Na prática, a situação é completamente distinta. A Comissão Interamericana tem recebido depoimentos e informações sobre diversas prisões, entre as quais está o "Combinado del Este", que é a mais grave do país e está localizada aproximadamente a 18 quilômetros de Havana. O depoimento transcrito a seguir é um relatório de uma organização não-governamental com sede em Cuba, realizado no mês de junho de 1995:29/
76. De sua parte, outro informe sobre a prisão de La Manga, província Granma, descreve a situação dos presos políticos assim:30/
77. Os depoimentos recebidos pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos refletem a gravidade da situação carcerária em Cuba, e não fazem nada mais do que confirmar que o Estado cubano não adotou medida alguma para cumprir com as regras mínimas internacionais para o tratamento dos detentos, instrumento internacional aprovado pelo Conselho Econômico e Social das Nações Unidas no dia 31 de julho de 1957. Mais ainda, a Comissão Interamericana considera que estes fatos e os que são citados a seguir constituem graves violações dos direitos humanos:
78. A exposição realizada permite que a Comissão Interamericana considere que a administração de espancamentos, longe de constituir incidentes isolados, é utilizada habitual e sistematicamente por agentes do Estado cubano como meio de castigo ou de intimidação. O grave disso é que, segundo as informações prestadas, as queixas por maus tratos dirigidas às autoridades competentes nunca prosperam. Cabe assinalar que o artigo 30.1, do Código Penal dispõe que:
79. Torna-se claro, então, à luz dos fatos e do direito expostos anteriormente, que o Estado cubano não apenas viola os princípios e normas consagradas nos diferentes instrumentos internacionais de direitos humanos, mas que além disso, descumpre suas próprias leis, vulnerando desta forma o direito à integridade pessoal dos detentos. Da mesma forma, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos deve manifestar sua profunda preocupação pela falta de cuidados médicos ou a insuficiência dos mesmos nos cárceres e outros centros de reclusão, reiteradamente denunciadas, e que em muitos casos gerou, como consequência, a morte ou lesões permanentes das vítimas.
VI. OS DIREITOS ECONÔMICOS, SOCIAIS E CULTURAIS
80. A Resolução da Nona Conferência Internacional Americana realizada em Bogotá, Colômbia, em 1948, e que deu lugar à Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem, assinala em seus considerandos, inter alia, que os povos americanos "têm como fim principal a proteção dos direitos essenciais do homem e a criação de circunstâncias que lhes permitam progredir espiritual e materialmente...". A Declaração Americana consagra não somente os direitos civis e políticos, mas também os direitos econômicos, sociais e culturais.
81. De sua parte, a Comissão Interamericana assinalou que "uma vida livre do temor e da necessidade comporta, inevitavelmente, garantir os direitos civis e políticos, posto que através da participação popular, aqueles que são objeto da negação de seus direitos econômicos e sociais podem participar nas decisões que relacionam-se com a destinação dos recursos nacionais e o estabelecimento de programas sociais, educacionais e de saúde. A participação popular, objetivo da democracia representativa, garante que todos os setores sociais participem na formulação, aplicação e revisão dos programas nacionais. E ainda que poder-se-ia afirmar que a participação política fortalece a proteção dos direitos econômicos, sociais e culturais, também é verdade que a aplicação desses direitos cria condições para que a população em geral seja capaz, isto é, de participar ativa e produtivamente no processo de tomada das decisões políticas".32/
82. A falta do direito à participação política, entendida como o direito de organizar partidos e associações políticas, tem sido um dos principais fatores a contribuir para a crise econômica de Cuba. A Comissão Interamericana sempre manifestou que "o debate livre e a luta ideológica podem elevar o nível social e as condições econômicas da coletividade, e excluir o monopólio do poder por um só grupo ou pessoa".33/
83. As cifras com as quais conta a Comissão Interamericana de Direitos Humanos assinalam que cerca de 80% do setor industrial cubano não funciona, e que cerca de 40% da população ativa está desempregada ou subempregada.34/ Como consequência disso, assinalou-se que o Estado cubano com o fim de compensar a perda de renda continua pagando cerca de 60% do salário aos desempregados; no entanto, esta quantidade não é suficiente para cobrir as necessidades básicas do trabalhador médio.35/ Isto obriga a tais trabalhadores segundo as informações prestadas empreender atividades ilegais ou a buscar trabalho no setor informal, ou nos empregos por conta própria que estão autorizados. Contribuem para restringir as opções de emprego as diversas formas de controle social estabelecidas pelo Estado, com a conseguinte seqüela de trâmites burocráticos necessários para obter-se as autorizações exigidas para mudança de emprego; no mesmo sentido atuam as modalidades de operação características de um sistema econômica ainda centralizado.
84. O Estado cubano adotou, no mês de setembro de 1995, uma Lei de Investimento Estrangeiro. Em um relatório das Nações Unidas, assinalou-se a preocupação que existe com a situação do emprego dos trabalhadores nas empresas de capital estrangeiro:
85. A Comissão Interamericana de Direitos Humanos considera que, à luz das reformas no âmbito econômico e trabalhista, é cada dia mais necessária a presença de sindicatos livres e independentes, que defendam os direitos trabalhistas dos trabalhadores. É no campo destes direitos que a Comissão encontra a maior contradição entre os postulados ideológicos do sistema e a operação prática do mesmo. Com efeito, um dos postulados do sistema que hoje impera em Cuba é a construção do socialismo para alcançar uma sociedade igualitária sem exploradores nem explorados. No entanto, os fatos e o direito vigente permitem que as situações de exploração se multipliquem.
86. A Comissão de Especialistas em Aplicação de Convênios e Recomendações da Organização Internacional do Trabalho, dentro do marco da aplicação do Convênio Número 87 (Liberdade Sindical e Proteção do Direito de Sindicalização) sobe as relações entre a Central de Trabalhadores de Cuba (CTC) e o Partido Comunista, manifestou inter alia que:
87. A grave situação econômica pela qual atravessa o país também afetou os setores da saúde, alimentação e habitação. Com efeito, a falta de equipamentos médicos e a escassez de remédios básicos são algumas das condições em que se encontram alguns dos hospitais do país. Segundo assinalou-se, os hospitais provinciais carecem de medicamentos básicos, tais como analgésicos, antibióticos, anestesia ou material de sutura. Esta situação gerou segundo as informações prestadas a falta de esterilização da roupa e do instrumental cirúrgico. O contraditório de tudo isto é que os produtos médicos fabricados no país destinam-se aos hospitais que prestam cuidados médicos aos estrangeiros. Nesta etapa da análise, é interessante observar o que manifesta, sobre este ponto, o Relator Especial das Nações Unidas, quando assinala que:
88. A cartela de racionamento, mediante a qual são distribuídos os alimentos básicos, foi diminuída ostensivamente, cobrindo somente os primeiros dez dias do mês. Assinalou-se, além disso, que o mercado agropecuário livre proporciona algum alívio para a crise econômica; no entanto, os preços são demasiado altos para o salário médio no país, que é de 180 pesos mensais, aproximadamente. Por exemplo, o preço oficial do arroz é de 24 centavos por libra, mas no mercado agropecuário custa 9 pesos por libra.
89. A esse respeito, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos deve reiterar sua doutrina, a qual estabelece que "Quando os setores mais vulneráveis da sociedade não têm acesso aos elementos básicos para a sobrevivência que lhe permitiriam sair de sua situação, está-se praticando a contravenção voluntariamente ou está-se tolerando a contravenção do direito de ser livre de toda a discriminação e os conseguintes princípios de igualdade de acesso e eqüidade na distribuição, e o compromisso geral de proteger os elementos vulneráveis da sociedade. Além disso, se essas necessidades básicas não são satisfeitas, vê-se ameaçada diretamente a própria sobrevivência do indivíduo, o que implica o direito à vida, a segurança pessoal, e como indicou-se antes, o direito a participar nos processos políticos e econômicos".39/
VII. CONCLUSÕES
De acordo com o assinalado ao largo deste relatório, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos chegou às conclusões que são expostas a seguir:
90. Algumas das medidas adotadas pelo Estado cubano em matéria de direitos humanos durante o período coberto pelo presente relatório são positivas, especialmente as que tem a ver com a libertação de presos políticos. Não obstante, a Comissão espera que este passo seja o primeiro de um processo que ponha fim ao encarceramento político de ainda outras 1.173 pessoas, que encontram-se purgando condenações nos cárceres cubanos. Outra das medidas que, entende a Comissão, merecer ser destacada, é a anuência concedida pelo Estado cubano para que algumas organizações internacionais de direitos humanos verifiquem in-situ a situação desses direitos em Cuba. A Comissão julga necessário, no entanto, que essa anuência não se limite a certos grupos, mas que seja aberta a todos os organismos internacionais de direitos humanos que a solicitem, a fim de avaliar a situação imperante nesse país. Finalmente, a realização de seminários sobre direitos humanos que promovam a observância desses direitos em Cuba, é uma medida positiva que deve ser mencionada.
91. Estas medidas, no entanto, não constituem nos fatos nem no direito, o desejo do Estado cubano de alcançar uma reforma substantiva que permita o gozo e o exercício pleno do direito à participação política consagrada no artigo XX da Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem, isto é, uma reforma que permita um pluralismo ideológico e partidário, que é uma das bases do sistema democrático de governo. A urgente necessidade de avançar-se pelo caminho da democratização e do respeito aos direitos e liberdades fundamentais exige a existência de condições propícias, e é responsabilidade fundamental do Estado cubano criar essas condições. A comunidade interamericana, por sua parte, tem também a responsabilidade de contribuir para a criação dessas condições, que levem à irrestrita vigência dos direitos humanos em Cuba.
92. Os direitos civis e políticos dos cidadãos cubanos continuam sendo seriamente violados pelo Estado. Assim, a discriminação por motivos políticos traduz-se geralmente em violações à liberdade de expressão, reunião, e de associação, as quais trazem consigo penas de privação da liberdade, detenções temporais, hostilização, ameaças, perda de emprego, buscas no domicílio, adoção de medidas disciplinares, etc. Também é motivo de preocupação para a Comissão as fórmulas legais que continuam sendo empregadas pelo ordenamento jurídico cubano para estabelecer os limites ao exercício dos direitos e liberdades reconhecidas aos cidadãos. De acordo com tais fórmulas, são os mesmos os que devem adequar esse exercício aos fins perseguidos pelo Estado; a concepção democrática é exatamente o contrário: é o Estado quem deve limitar sua ação diante dos direitos inerentes à pessoa e reduzir sua intervenção, apenas para alcançar a vigência prática dos direitos civis, políticos, sociais, econômicos e culturais de todos os governados.
VIII. RECOMENDAÇÕES
A Comissão Interamericana de Direitos Humanos, com base nas conclusões do presente relatório, formula as seguintes recomendações ao Estado cubano:
93. Prevenir, razoavelmente, as violações dos direitos humanos e investigar exaustivamente aqueles fatos nos quais tenha ocorrido a violação do direito à vida, a fim de identificar os responsáveis, impor a eles as punições pertinentes e outorgar aos familiares da vítima uma adequada reparação e indenização.
94. Adotar medidas urgentes com o fim de deixar em liberdade sem condições as pessoas que cumprem penas por delitos contra a segurança do Estado, associação ilícita, publicações clandestinas, periculosidade, rebelião, propaganda inimiga e outros conexos, assim como por tentar-se sair do país de maneira irregular.
95. Eliminar, da legislação penas, toda figura delitiva que preveja punição contra os padrões democráticos internacionalmente aceitos, a liberdade de expressão, associação e reunião, em especial os delitos mencionados no parágrafo anterior.
96. Eliminar, do Código Penal, os dispositivos sobre o estado perigoso, as medidas de segurança pré-delituosas e os termos "legalidade socialista", "socialmente perigosa", "normas de convivência socialista", já que sua imprecisão e subjetividade constituem um fator de insegurança jurídica que cria as condições para que as autoridades cubanas cometam arbitrariedades. Da mesma forma, eliminar, da norma penal, referência à "advertência oficial", mediante a qual ameaça-se punir os indivíduos que tenham "vínculos ou relações com pessoas potencialmente perigosas para a sociedade".
97. Cessar a hostilização realizada contra grupos de defesa dos direitos humanos e outros de orientação política, e permitir a legalização dos mesmos.
98. Reformar a Constituição Política do Estado com o fim de estabelecer uma separação de poderes que evite a relação de dependência da administração de justiça com respeito ao poder político.
99. Cumprir as regras mínimas internacionais para o tratamento dos detentos, e assim melhorar as condições de vida da população carcerária de Cuba. É imperativo, da mesma forma, que o Estado cubano adote medidas urgentes com o fim de evitar que as autoridades penitenciárias continuem violando o direito à integridade pessoal dos reclusos.
100. Adotar as medidas necessárias a fim de permitir o pluralismo ideológico e partidário para o pleno exercício do direito à participação política, de conformidade com o artigo XX da Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem.
101. Ratificar os principais instrumentos internacionais de direitos humanos dos quais Cuba ainda não é parte. |